domingo, 3 de março de 2013

Show "Carta de Amor" em Uberlândia ,02.03.2013

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Um texto lindo escrito por Sidney Gomes, um ReVersiano muito querido:
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Eu não podia ir a Uberlândia ver Bethânia, mas me senti com um dever. Mesmo ela mal sabendo da minha existência, queria que ela se sentisse acolhida por um simples fã. Mas um fã antigo o suficiente para entender a dor de uma estrela. Na volta aos palcos depois da morte da rainha-mãe, lá estava eu, para apóia-la. Pretensioso? Talvez. Mas sou grato demais à artista que me fez conhecer outros mundos usando apenas o fone de ouvidos.
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Uma tempestade caiu sobre a cidade do Triângulo Mineiro. Do ponto de vista de Maria Bethânia, começou bem. A água lava tudo. Do meu ponto de vista, só de atravessar a avenida cheguei completamente ensopado ao shopping-hotel-centro de convenções, local do show.
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E o espetáculo, que não pode parar, recomeça. Bethânia volta aos palcos. Fiquei imaginando os momentos anteriores à saída do camarim. Depois de 48 anos, ela não tinha mais pra quem ligar para pedir a bênção antes de cantar. Não deve ser fácil esquecer certos velhos costumes.
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Dona Maria estava mais contida, sim. Eu também estava. Não abri a boca durante todo o espetáculo – ao contrário resto do público. Estava completamente atento e pronto para o que ela precisasse, como se fosse um salva-vidas. Mesmo que longe do palco. Se ela precisasse que eu risse, eu riria. Se fosse pra chorar, opa!, deixa comigo. Se fosse apenas para olhar com atenção, meus olhos eram só dela. Mas não precisou.
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O que todos esperavam era um momento de homenagem à memória da querida Canô. Isso não aconteceu explicitamente. Mas para bom entendedor – ou meio viajante – o show ganhou outro significado. “A menina foi embora e me deixou”; “Mulher mais adorada, agora que não estás, deixa que rompa meu peito em soluços”; “Quem me leva os meus fantasmas?”; “Na primeira manhã que te perdi acordei mais cansada que sozinha”; Essa amargura do meu peito, ah, vem, arranca!”; “Ninguém quer a morte”... Talvez ela não tenha percebido o que estava dizendo. Mas eu deixei que essas citações fossem a homenagem que todos queriam. E elas já estavam todas lá, desde o começo. Ironias de uma cantora mediúnica.
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Agora, me atendo aos fatos: ela mudou completamente o semblante quando cantou que trabalhava o ano inteiro só pra passar fevereiro em Santo Amaro. Este ano ela não passou fevereiro em Santo Amaro. E ela sabe que nunca mais seus fevereiros serão os mesmos.
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Em Reconvexo, passou o microfone para a mão esquerda. Pôs a direita sobre o peito ao falar da novena de dona Canô. O mais nova espada ainda deve demorar a cortar como antes.
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No fim, breves palavras sobre a dificuldade em voltar aos palcos. E está de bom tamanho. Muita sorte de uma mãe que teve o enorme privilégio de ser devidamente homenageada em vida pela filha que é uma das maiores artistas do mundo em todos os tempos.

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MAKING OF:

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- O Center Convention é um horror. Coitado de quem pagou 250 reais pra ficar nas pontas. Viu meio palco. O lugar parece feito pra palestras, colações de grau e afins. Antes do show, nas quatro paredes, de fora a fora, projeções de propagandas em movimento. Pra quem tem labirintite, como eu, é pedir pra morrer.
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- A única mudança no roteiro foi a inclusão de Olhos nos olhos entre Barulho e Fera ferida. No bis, saíram E o mundo não se acabou e Ela Desatinou. Entraram Explode Coração e O que é, o que é. Não acho que sejam mudanças definitivas. Parecem concessões feitas a uma cidade do interior.
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-As senhoras se vestiram para o Casamento Real®.
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- Não sei pra quê pagar 250 reais pra bater papo. Uma cidade rica, que vive do agronegócio... já podem imaginar o gosto da galera, né? Não estão habituados a este tipo de show.
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- O público de Uberlândia se animava mais nas músicas mais conhecidas, como é normal em shows no interior. Muita gente vai pra ver isso mesmo. E devem ter saído satisfeitos com Olhos nos olhos, Negue, Explode coração, Sangrando, Fera ferida, O que é o que é, Não enche, Fogueira...
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"Canções e Momentos" e Sangrando":
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Aqui, o momento em que "Ela" fala em público, pela primeira vez, sobre a morte de dona Canô:
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"Reconvexo" e "Sambas de Roda"
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Texto e Vídeos de Sidney Gomes. Obrigadão!!!
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3 comentários:

santana disse...

Que belo texto, Sydnei! estava querendo saber como havia sido em Uberlândia, e você esclareceu plenamente. Diante de seus comentários...'vestidas para casamento real'(algo assim), inclusive...dei por visto...rs

Aguardo em SP. Um abraço.

Salviano disse...

Olá Sydnei, acho importante terem pessoas que se propõem a escrever sobre uma artista como Maria Bethânia. Acho também importante que escreva sobre as experiência que viveu com o show aqui no INTERIOR, mas não se iluda que as pessoas daqui sejam tão ignorantes de não reconhecer que o Center Convention é realmente ruim, mas ocorre que por deficiências administrativas não temos um espaço apropriado para receber grandes shows. Digo grande pelo aparato técnico que os mesmos necessitam. Foi sim um grande show, para as proporções que temos e acho que ninguém se importou em sair de lá contemplado pelas músicas antigas, há identidades e identidades quando se trata de apreciação de uma obra de arte e juízo de valores não são cabíveis aqui. Admiro a sua capacidade em contemplar de maneira menos interiorana, mas como disse há identidades. Obrigado Rodrigo Salviano

Sidney Gomes disse...

Prezado Salviano, peço perdão se, de alguma forma, ofendi quem é do interior. Eu jamais faria uma coisa dessas - mesmo porque eu sou de uma cidade que não tem nem 90 mil habitantes. Meu olhar é do interior, não da capital. Moro em BH há 10 anos, e quando vou a outros lugares, não me sinto confortável em dizer que "sou de BH". Sempre digo que "moro em BH". Por isso sei bem que há, sim uma diferença de plateias. Só um exemplo: Bethânia vem a BH praticamente uma vez por ano. Em 48 anos de carreira, foi a primeira vez em que ela pisou no Triângulo. É óbvio que ela tem que cantar alguns sucessos para satisfazer parte do público que foi lá pra isso. Se em BH ela não cantar nenhum sucesso, tudo bem, fica pra próxima. Quanto ao mau comportamento de parte do público (que, na média, foi bem carinhoso)é só ouvir o áudio do show, que está postado na íntegra no 4shared. O arquivo fala por si só. Um grupo de 6 pessoas que estava atrás de mim não parou de falar um minuto sequer. No mais, só tenho a dizer que vc pode se orgulhar de viver em Uberlândia. Excelente cidade.